domingo, 21 de dezembro de 2008

Bonequinha Linda


Cláudia sempre havia chamado atenção de todos pela sua beleza. Desde pequena foi chamada para fazer comerciais e tirar fotos para publicidade. Existe uma crença de que crianças belíssimas não serão adultos muito atraentes. Isto já estava apavorando os pais de Cláudia que viam uma promissora carreira para a menina caso ela pudesse manter os contatos que seus pais já haviam feito. Os temores se tornaram infundados com o passar do tempo e Cláudia foi uma adolescente belíssima e mais tarde uma mulher estonteante.

Com a vida adulta seus hábitos de criança não mudaram muito. A maior parte de seu tempo ela ficava quietinha esperando que acabassem de arrumá-la. Depois que seu visual estivesse pronto, ela iria ficar quietinha na frente das câmeras e depois passear em silêncio enquanto ouvia exclamações à sua volta. Ela deveria manter aquela expressão de indiferença enquanto outras pessoas falavam sobre seu charme e beleza. Com as outras garotas ela conversaria discretamente por pouco tempo, até que sua mãe ou seu agente pedisse sua atenção em outro lugar.

Cláudia jamais precisou fazer nada além de ficar parada para conseguir a atenção de quem quer que fosse. Tanto na carreira profissional ou para atrair um homem por quem se interessasse, ela só precisaria ficar quieta e manter-se por perto. Quando sua presa finalmente se aproximasse ela o deixaria falar. Ela manteria o ar de indiferença e guardaria na memória o que lhe interessasse. Com seu silêncio, geralmente as pessoas falavam mais e mais e então mais fascinados ficavam os homens e mais vantagens profissionais apareciam. Todos a achavam uma mulher inteligentíssima, só por saber ficar quieta. Em nenhuma situação, profissional ou pessoal, ela daria uma resposta ao final da conversa. Discutiria com seu agente ou sua mãe e depois esperaria um telefonema para dar a resposta final. Telefonemas também vinham com a mesma facilidade que os olhares. O segredo era saber ficar quieta e manter a aparência que os outros quisessem ver.

Porém, um dia, um fotógrafo a deixou bastante confusa. Ele não deixou claro se seu interesse nela era pessoal ou profissional. Ela estava acostumada com interesses pessoais camuflados por interesses profissionais, mas mais cedo ou mais tarde eles acabariam se revelando. O fotógrafo parecia muito entusiasmado com um projeto profissional junto a um empresário conhecido de ambos, mas que não estava na conversa.


- Nós vamos fazer muito dinheiro.

Ele nem sequer perguntou se ela estaria interessada ou não. Ele falava sem parar e ela não teria a chance de retrucar coisa nenhuma mesmo que tivesse a intenção. Ele a olhava com paixão e dizia o quanto ela era perfeita, mas a palavra dinheiro aparecia em cada frase. Nem ele parecia saber qual era seu verdadeiro interesse nela. Quando o agente chegou Cláudia ficou aliviada por um instante, até que viu os dois falarem no mesmo tom histérico e exultante, como se já houvessem conversado a respeito disto antes. Os dois sabiam exatamente do que estavam falando. Algo sobre uma boneca. Esta boneca não fazia nada de especial. Não cantava, não dançava, seus movimentos não eram muitos pois as articulações a deixariam feia, ao que parecia. Esta boneca tinha apenas uma coisa de especial: Ela era feita à imagem de Cláudia.

O tal empresário tinha um escritório no último andar de um prédio com o seu nome. Parecia um homem nervoso, sempre falando alto. Cláudia viu vários desenhos que não pareciam em nada com ela, mas que tinham o objetivo de transformar-se na boneca que levaria o seu nome.
- Ainda não está bom! - zangava-se o empresário - O que as crianças querem é uma boneca com a qual elas possam se identificar. Eu não quero mais uma boneca igual às outras. Eu quero que as crianças se lembrem que existe uma Cláudia de verdade andando por aí!

A negociações continuaram e a árdua busca para um desenho que fosse parecido o bastante com a Cláudia de verdade. Em meio a seus tantos compromissos, Cláudia foi chamada para o escritório do dono daquele prédio. Quando ela chegou lá ele tinha nas mãos o corpo de uma pequenina Cláudia sem roupas, olhos ou cabelos. Apenas o contorno dos traços de seu corpo. Ele a chamou ali para comparar pessoalmente a criatura Cláudia e sua criação.

- Pronto! Era isto que eu queria. Toda menina vai querer uma destas. Esperem só até acrescentarmos os detalhes! Acho que vou fazer outra maior com mais funções que esta. Cláudia apenas observava aquela coisinha frágil sendo agitada pela mão do empresário. Cláudia havia brincado muito pouco com bonecas, talvez por isso não encarasse a pequena coisinha como uma diversão e sim como um estranho recém-nascido. No canto da sala o fotógrafo a observava intrigado. Aquele projeto tinha tudo para fazer milhões. Ele estava imaginando se ela tinha plena noção do que a esperava.

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O mundo parecia ter desabado sobre aquele escritório no último andar. O empresário segurava as mãos com a cabeça.
- Como é que você faz uma coisa destas comigo, menina!?

Cláudia preferiu deixar que seu agente falasse com ele. Ela não via razão nenhuma para pedir desculpas por um acidente que, afinal de contas, havia acontecido com ela.

- Jackes, não tem o menor problema! O cabelo da boneca ainda não foi decidido, foi?

- Ninguém quer uma boneca de cabelos curtos! Não há nem como fazer isso! O náilon fica horrível neste comprimento! Se optarmos por fazer o cabelo já no molde, ela vai ficar parecendo um homem! - o agente de Cláudia se jogou nas costas da poltrona e ficou calado. O empresário continuava - Bonecas têm cabelos de princesinha! Aqueles que vão até à cintura! Como é que isto aconteceu, garota!?

Cláudia não gostou de ser chamada de garota, nem viu motivos para responder àquele homem grosso. Seu agente já estava contando toda a experiência horrorosa do comercial que ela havia gravado no dia anterior. O produtor havia feito questão de fogos de artifício e um deles estourou para o lado errado, justo onde Cláudia estava. Seus cabelos estavam no seguro e ele iria pagar bem caro por ter arriscado a vida de Cláudia daquela maneira. Poderia ter acontecido algo bem mais grave do que simplesmente ter que cortar seus cabelos bem rentes à nuca. Ela estava aliviada por ter saído desta sem nenhuma queimadura no rosto e aquele homem queria que ela se desculpasse por ter tido sorte?!

- Isto é o pior que poderia ter acontecido! Nossa modelo mudar o visual justo agora que tudo estava perfeito. Quero este cabelo longo de novo, ouviu, menina? Tem muito dinheiro envolvido nisto!


Cláudia estava muito confusa com os valores daquele homem e de todos naquela sala. Até sua mãe ficou inconsolável com a notícia que sua filha teve que cortar seus longos cabelos, para só depois ficar aliviada pela sorte que a filha teve. Depois de tantas grosserias o empresário e o fotógrafo começaram a falar de amenidades e fizeram algumas piadas sem graça. Tanto às amenidades como às piadas Cláudia respondeu com sua tradicional frieza. Aquele sorriso que não chega a ser um sorriso, com o qual Claudia havia conquistado meio mundo e escondido tudo o que sentia realmente por baixo de um verniz perfeito.

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Dias depois Claudia recebeu em sua casa a visita do fotógrafo. Ele trazia consigo um protótipo da boneca. Os cabelos eram exatamente como os cabelos que Cláudia tinha antes. Os lábios tinham algo de estranho e não pareciam naturais. Já os olhos eram igual aos de qualquer boneca.

- Ainda bem que você escolheu não ir mais lá. - riu-se o fotógrafo - Jackes está uma fera! Não gostou nada deste rosto. A única coisa que ficou do jeito que ele queria já não parece com você: os cabelos. Ele tentou fazer os lábios carnudos como os seus, mas parece que ninguém acha um meio termo! Ou ficam grossos demais ou finos demais. Outro desafio é imitar este teu sorriso de Mona Lisa...

Cláudia não se sentia nem um pouco envaidecida. Estava de mau humor sem poder falar muito. Não que falar muito fosse um hábito seu, mas agora ela não tinha escolha. Um batom contaminado havia lhe estourado os lábios. Qualquer movimento com a boca causaria uma nova ferida que doía horrores!

- Está feio mesmo, hein? Você já está medicada?

Claudia fez que sim. Não estava muito interessada nos avanços daquele homem. Todo aquele projeto dava-lhe uma sensação desagradável de perda e ela ainda não sabia explicar por quê.

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Ela foi chamada para o escritório de seu agente só para se aborrecer de novo. Havia muito ela já tinha dito que não queria mais ficar à disposição de um projeto que não demandava mais a sua presença do que a de simples fotos. Ela não poderia ficar desmarcando compromissos para atender caprichos daquele homem.

- Eu estou com os riscos deste negócio todo, Matos! Não quero saber da agenda desta mocinha! Agenda que aliás não pode estar tão cheia assim! Olhe só para ela! Está um lixo!

Mas mesmo assim ainda trabalhava. Ela havia até sido chamada para um comercial onde somente seus olhos seriam focalizados. Isto era um alívio pois seus lábios estavam cada vez piores. Se fosse outra modelo não teriam tanta boa vontade com alguém que além de perder cabelos de bom comprimento, ainda estava com os lábios inchados e feridos. Por outro lado lá estava a boneca em cima da mesa. Perfeita em cada detalhe, exceto pelos olhos que ainda estavam “sem vida”. Era esta a reclamação daquele empresário idiota. Ora! O que será que ele estava esperando? Que ela desse seus olhos para a boneca?

- Com estas fotos que Claudia vai tirar hoje o senhor terá uma fonte perfeita para fazer os olhos!

- Eu não quero fotos! Quero que ela fique à disposição de nossos artistas! Não quero passar o mesmo arrocho que passei com os lábios dela. Quero esta boneca o mais realista possível e as fotos não são boas o bastante.

- Eu garanto a você Jackes, depois desta campanha, - vira-se para Cláudia - que caiu do céu para nós, ela vai poder fazer as fotos, poses ou que você quiser na hora que você quiser!

- Acho bom!

Cláudia mantinha os olhos na boneca sobre a mesa. Sua cabeça estava longe. Ela estava procurando entender por que aqueles olhos não serviam. Chegou à conclusão que a boneca parecia cega com aqueles olhos muito abertos, fixos no nada.

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- Ah! Isto eu não vou aceitar mesmo! - Jackes bufava naquele escritório, andando de um lado para o outro. Matos e Jorge, o fotógrafo, tentavam lhe explicar em vão que foi um acidente o que acontecera com os olhos de Cláudia. Afinal, ela não estava acostumada a passar gel nos cabelos. Como poderia saber que seus olhos sofreriam uma reação alérgica ao gel, quando a franja caiu sobre eles?

- Não quero saber! Isto tudo está me cheirando à desculpa esfarrapada! Primeiro ela corta os cabelos depois do projeto iniciado, depois tem problemas nos lábios justo quando eu tenho que terminar a boca da minha boneca! Agora ela fica com os olhinhos ardendo quando eu preciso deles? Não quero saber! Quero ela aqui agora! Estas fotos estão muito diferentes do olhar que ela tem normalmente. Aquele olhar de superior, de deboche. É isso que as meninas gostam nela, e é isso que elas vão ter.

- Mas já está aí, Jackes! Mais parecido, impossível! - Jorge já estava com pena de Cláudia e de Matos. O que Jackes estava fazendo era simplesmente tirar o sossego dos dois, já que ele não estava tendo sossego nenhum com este projeto.

- Eu quero comparar! É o meu dinheiro aqui! Vocês estão entrando com risco nenhum!

Neste ponto até Matos perdeu a paciência.

- O incrível é que, até agora, só nós estamos perdendo com isso!

- Isto já não é problema meu! Se esta garota não ficasse sassaricando por aí ao invés de fazer o serviço dela, nada disso teria acontecido! Matos não teve nem resposta para isso. Mas como também não tinha remédio, tratou de convencer Cláudia a sair de casa do jeito que ela estava, pelo menos para satisfazer os caprichos de Jackes. Assim que ele visse o estado da moça ele a deixaria em paz. Mais satisfeito, Jackes pediu para a assistente trazer o protótipo do carro que seria vendido separadamente. Era o mesmo modelo do que o que Cláudia dirigia.

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Os três homens esperaram e esperaram. Enquanto esperavam, passavam de mão em mão aquela boneca tão perfeita. Era como segurar Cláudia na palma da mão e logo, toda criança poderia fazer o mesmo.

Quando começaram a irritar-se com a demora de Cláudia começaram a imaginar as possibilidades. Cláudia havia ficado muito sentida com a maneira com que Matos falou com ela no telefone. Aquilo havia sido apenas reflexo da pressão que Jackes havia causado. Só que não era do feitio dela não comparecer a compromissos. Só tarde demais começaram a ficar preocupados. Só quando a mãe de Cláudia foi notificada do acidente de sua filha pelo celular. Só acreditaram quando chegaram ao local e os bombeiros ainda estavam trabalhando. A imprensa já estava lá. Ninguém tinha muita esperança de tirá-la com vida dos metais retorcidos. Sua mãe ainda teve esperança que não fosse ela naquele carro. Ninguém a reconhecia. Principalmente porque ela já estava diferente antes deste desastre acontecer. Mas os documentos na bolsa e as roupas tiraram a dúvida.

Lá estava ela, vagamente reconhecível, mais quieta do que nunca.



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segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Tempo Perdido


Ela acordou como sempre acordava. Olhava para o relógio ressentida e perguntava a si mesma se aquilo era vida. Começou sua corrida de sempre. Foi se arrumar sem prestar atenção no que via no espelho. Escolheu suas roupas sem prestar atenção no que escolhia e saiu para o trabalho sem prestar muita atenção para onde estava indo.

Chegou ao metrô na hora de sempre, como se já estivesse programada para pegar a mesma condução para o mesmo lugar todos os dias. Tanto o caminho para o ofício quanto o ofício já eram feitos tão mecanicamente que ela nem pensava no que fazia. Apenas fazia a mesma coisa todos os dias e todos os dias eram iguais. Ela esperava ansiosamente o fim do dia. À noite ela só queria voltar para casa e dormir. Talvez até conseguisse sonhar.

Já desejando que o dia chegasse ao final, ela entrou no metrô. Mas, checando o mesmo relógio que sempre checava, esperando ver a mesma hora de sempre, ela percebeu que o tempo passara e ela não havia percebido. Apesar de ter feito tudo como sempre fazia... era tarde demais! Já não havia razão sequer em ir para o trabalho, de tão atrasada que estava. O mais horrível era tentar achar para onde foram todas aquelas horas perdidas! Ela havia feito tudo como sempre. O que teria acontecido? Foi um dia inteiro que ela não sabia como havia passado!

Em meio a seu desespero ela abriu os olhos em seu quarto, deitada em sua cama, com o relógio à sua frente. Ela checou o relógio apavorada com a horas perdidas. E então veio o alívio. Ainda era o meio da madrugada e ela ainda tinha bastante tempo para dormir. Fechou os olhos novamente e procurou o sono.

Mas o sono, ela não achou. Completamente descansada no meio da madrugada ela resolveu que se arrumaria com antecedência. Assim teria mais tempo para se arrumar. Mas ela sempre se arrumava no mesmo tempo, então decidiu que passaria as horas tomando café. Só que sempre levava o mesmo tempo para tomar café e então preferiu sair para o trabalho mais cedo, assim teria mais calma para chegar ao trabalho.

O metrô ainda estava de portas fechadas quando ela chegou até ele. Ela não sabia o que fazer. A caminhada havia sido longa o suficiente para gastar os minutos até a hora do metrô abrir. Mas ela nem percebeu em sua caminhada que o céu não mudava. Ainda era madrugada. Não poderia ficar andando nas ruas desertas assim - o perigo era muito grande. Olhou para todos os apartamentos de janelas escuras, poucas luzes acesas e as ruas totalmente vazias. Ela teve medo. Não podia lembrar-se de quando viu as ruas tão vazias assim. Podia lembrar-se de rostos que passavam rapidamente por ela todos os dias, mas não das ruas sem gente, nuas daquela maneira. Era apavorante. A cidade não parecia estar simplesmente dormindo. Parecia estar morta. Ela não agüentaria ficar mais tempo na rua esperando que o metrô abrisse, nem queria fazer novamente o caminho para casa para ter que voltar mais tarde. O dia não parecia clarear mas ela sabia que tinha acordado há muito tempo atrás. Não havia nenhum relógio por perto e ela havia esquecido o seu, como nunca fazia. Até onde ela percebia, o tempo havia parado.

Mas e se ele andasse novamente no caminho de volta para casa. E se ela se atrasasse outra vez, como havia atrasado antes... antes de acordar...

Quando deixou sua cabeça cair de encontro ao peito ela acordou assustada. Havia adormecido no banco do metrô e sua bolsa estava no chão. Sentiu-se tão aliviada por reconhecer a estação em que estava e os rostos de desconhecidos que nem pensou em como havia chegado até aquele banco. Ela apenas ressentiu ter que ir para o trabalho depois de ter dormido tão mal à noite.

As pessoas que lhe eram familiares foram saltando em estações que ela não reconhecia. De tanto ver as mesmas pessoas todos os dias, apesar de não falar com elas, ela sabia em que estação elas saltavam, e estas não eram as estações de sempre. Havia algo de estranho nelas. Não seguiam o padrão de todas as estações do metrô. Olhou para o quadro dentro do metrô procurando sua estação mas não haviam nomes. Apenas marcas ilegíveis.

A cada parada o metrô se esvaziava. Todas as pessoas desciam parecendo saber para onde iam e nenhuma delas parecia notar mudança nenhuma naquele cenário. O carro já estava se esvaziando. Ela continuava a temer chegar atrasada ao serviço. Preocupada, ela tentou ler ao menos o nome da estação no quadro da plataforma, mas não conseguiu. Conseguiu porém localizar um dos relógios da estação, para saber se estava atrasada. Mas agora os relógios marcavam os anos. Ela só sabia contar minutos e horas, não os anos. Aqueles relógios não a ajudavam. Ela tentou calcular o tempo que havia passado desde... desde... Ela tentou, mas o metrô entrou em movimento e rápido como uma bala mergulhou no túnel escuro com uma só passageira.

E não parou mais.


Um conto de carnaval

Um conto de Carnaval: Eu escrevi este conto há muito tempo... Muita coisa mudou no meu trabalho desde então. É um lugar adorável, com gente adorável e maluca. Mas eu não pensava assim no começo. Talvez eu não compreendesse meus coordenadores e meus colegas tão bem quanto hoje. Talvez eu levasse as coisas à sério demais.


Eu estava danada da vida. Trabalhar na sexta-feira à noite, antes do carnaval sempre foi uma chateação para mim. Meus coordenadores nunca gostaram da idéia de me liberar. Entendam que esta era a única chateação do ano, mas mexia muito comigo. Um certo dia, quando estava me preparando para me aborrecer de novo, os dois já adiantaram que não tinha problema nenhum. Eu estava liberada para ir para Araruama mais cedo.


Eu fiquei muito feliz, mas não entendi o que os fez mudar de atitude.

Então, imaginei a única explicação plausível para isso:


Um Conto de Carnaval

Era uma vez um casal que cuidava de um curso de desenho e coordenava seus professores. Um lugar muito colorido e divertido onde os pequenos artistas iam sujar a cara de tinta sem que a barra sujasse para o lado deles – já que era tudo em nome da arte. Nada muito diferente de um barracão de Escola de Samba, pois na hora da saída os moleques iam desfilando pelo caminho de casa mostrando seus apetrechos coloridos para quem quisesse ver.

Claro que isso tudo dava trabalho para os professores. Mas a verdade é uma só: Quem quer ralar vai ser professor. Quem quer ganhar vai ser doutor! Mesmo sem o doutorado a professora Patrícia sabia que, feriado, mesmo não sendo santo, era sagrado. Então ela pediu para falar com o diretor Marcelo e a diretora Sheila.

- Chefia, me libera de dar aula na sexta-feira de noite. É quase carnaval e é muito difícil que essa galera venha à aula.

O diretor e a diretora pularam nas cadeiras:

- De jeito nenhum. Ninguém aqui é macaco gordo pra ficar quebrando o teu galho. O feriado é só na terça. Tira o cavalinho da chuva. Pra seu governo, vais trabalhar no sábado também.

A professora ficou muito triste. O engarrafamento que ela iria pegar seria indigesto além de perder dois dias de feriado. Ela ainda chorou mais um pouquinho. Prometeu que compensaria as aulas depois.

O diretor Marcelo estava impassível.

- Tá ruim pra todo mundo mas pra nós tá pior, dona Patrícia! Não toque mais nesse assunto ou o bicho pega para o seu lado!

Vencida, a professora entendeu que “tá ruim, mas tá bom”. Pelo menos lhe restavam os dias de Carnaval mesmo. De domingo até a quarta.

Ao chegarem a seu modesto apartamento, conseguido a duras penas e muitos feriados não enforcados, os dois diretores começaram a confabular.

- Vem cá, Marcelo. A terça-feira é gorda, a quarta-feira é de cinzas... A segunda é o quê?

- Sei lá, mulher... Segunda de Carnaval?

- Eu tô achando que a segunda não é Carnaval...

- Então não tem nem conversa! Ninguém vai viajar coisa nenhuma. Vão ralar na segunda e vamos botar os pivetes pra desenhar. Meu nome é Trabalho!

- O meu também! E como estou ralando feito louca, todo mundo tem que ralar também. Mandei a empregada fazer Feijoada.

E, sem pensar no amanhã, os diretores e seu rebento, Vitinho, mergulharam na Feijoada. Ficaram conversando até tarde enquanto o garoto quase encostava seu joguinho no nariz. Como nem a pilha do moleque, nem a do joguinho acabavam, o garoto foi pra cama agarrado com o estrupício barulhento.

Ainda ouvindo a barulheira do brinquedo do moleque, os diretores foram dormir. Mal começaram a roncar e a cacofonia piorou. O quarto foi ficando um palco iluminado e uma inexplicável chuva de confete caiu sobre os dois. Um tamborim e uma cuíca pareciam estar chorando nos seus ouvidos. O casal de diretores sentou na cama e olharam pasmados para um vulto indistinto em pé, em frente à cama.

- Quem é você? – berrou a diretora Sheila, a primeira dos dois a sair da pasmaceira.

- Coloquem os óculos que vocês vão ver. – respondeu o vulto.

Os dois eram míopes. Colocados os binóculos, eles reconheceram um vulto que lembrava Martinho da Vila com uma corda no pescoço.

- Sheila? Tu tá sonhando ou sou eu?

A figura sorria e sambava no quarto dos dois.

- Tá sonhando um sonho de um sonho magnetizado. Mantenham as mentes abertas e os bicos calados. Eu sou o Fantasma de seus Carnavais Passados, a Segunda Feira Enforcada. E se vocês acham que sou eu que estou com a corda no pescoço, dêem uma olhada no passado de vocês...

Uma forma que lembrava o símbolo do MacDonald’s estava dentro do quarto deles e começou a brilhar. Os dois foram transportados para a oficina onde haviam começado a trabalhar. As crianças berravam na sala penduradas nos cachinhos da diretora Sheila, que tinha tinta até na consciência.

- Mas não vai ter aula por quê? – Um pai cheirando a uísque importado estava de mãos na cintura, botando banca em frente da mesa de Marcelo, que explicava pacientemente.

- Senhor Scrooge, dia 24 é a véspera de Natal. As famílias vão querer passar o dia unidas.

O tal pai de aluno já estava meio gagá. Deixou pra ter filhos bem tarde e teve um menino que também não era muito certo das idéias.

- A gente não faz nada no dia 24! – berrou o pequeno Scrooge. Quando o moleque chorava, coisa que acontecia o tempo todo, parecia um gato com o rabo preso num moedor de carne. – Por que não vai ter aaaaaaaaaaaaaaulaaaaaaaaaa?

O velho Scrooge meteu a mão nos bolsos fazendo carinho na grana que lá mantinha.

- Eu estou pagando. Se ele quer aula, vai ter aula.

Sheila se descabelou de lá de dentro pra ver o que era aquela gritaria. Foram muitos panos quentes e muito bafafá até o velho calar a boca.

O Fantasma da Segunda Enforcada cheirava a cerveja e parecia rir da história toda.

- Vocês não botaram o galho dentro dessa vez, mas ficaram meio escaldados. Cada vez que o feriado caía na quinta-feira, vocês se esmeravam para os alunos aparecerem na sexta-feira.

Sheila se queimou.

- A gente vive do dinheiro deles! E as contas, como é que ficam? Tem que tratar o aluno à pão-de-ló mesmo!

O diretor Marcelo assinava embaixo.

- Se a gente não trabalhar o dinheiro não entra! Dinheiro evapora, dívida não.

O Fantasma Segunda-feira continuava de bom humor.

- Calma, galera. Não tô criticando vocês, não. Pensa que eu não sei das despesas? Vocês são bons no que fazem. É por isso que vocês têm alunos. Não é pelo que os clientes malucos têm de ruim – e vocês aceitam. Mas é pelo que vocês têm de bom – e os alunos aproveitam. Eu sei como é que é: manda quem pode, obedece quem tem juízo. O negócio é que vocês já podiam estar mandando.

Mais uma vez, a diretora interrompeu.

- Mas a gente manda. Temos autoridade sobre nossos funcionários e somos muito responsáveis.

- É, na tua casa todo mundo é bamba. Só que vocês só podem contratar gente sem vida social. Eu só tô batendo essa idéia pra vocês pra vocês sacarem como é que a coisa tá andando. Eu sou um enforcado feliz, mas vocês se amarraram tanto em trabalho que não querem saber de outra história. Esse enredo começou aí!

O portal, que agora já estava reconhecido como a Apoteose, mostrava Marcelo e Sheila trabalhando feito doidos. A cena foi se desmanchando até os dois se verem na cama de novo. A batucada parou e o jogo do Vitinho já estava devidamente encostado. Os dois olharam um para o outro. Antes que o diretor falasse qualquer coisa, Sheila botou as mãos nas cadeiras.

- Mas quem é aquele enforcado pra ficar dando lição de moral na gente!? Tu viu como aquele homem cheirava à manguaça, Marcelo?

O diretor ainda estava meio tonto.

- Mesmo que eu acreditasse que isso tudo não passa de uma indigestão... O que aquele maluco achou que a gente podia fazer? Não vamos dar bola para aquele cachaceiro, não! Certos, estamos nós!

E com essa decisão, foram dormir. Mal pregaram o olho e a batucada voltou com bumbo de marcação e apito.

- Foram me chamar... Eu estou aqui, o que é que há?

Os dois sentaram na cama outra vez, e desta vez lembraram de colocar os óculos. Uma dona Marrom, gorda como ela só, estava sentada em CINCO cadeiras. Cada uma das cadeiras tinha um dia da semana gravado. Sábado, domingo, segunda-feira, terça-feira e quarta-feira. As cadeiras flutuavam logo acima do pé da cama dos dois, o que representava um perigo. Se a gravidade se lembrasse daquela dona, era capaz da mulher perfurar o chão.

- Alguém me avisou pra pisar nesse chão devagarinho. – Disse ela com um sorriso. O cabelo era comprido, cheio de trancinhas fininhas presas nas pontas com continhas coloridas.

Desta vez foi Marcelo quem teve a coragem.

- Esse quarto virou a casa da sogra?! A senhora é quem?

Com aquela voz grossa que senhoras corpulentas costumam ter, ela soltou uma gargalhada rouca e abriu os braços ameaçando se jogar no coitado do Marcelo.

- Ô, meu querido, tá me estranhado? A mim, tu reconhece! Até tu me respeita, meu guri. Eu sou a Terça- feira Gorda. Eu sou o Carnaval! O Fantasma dos Carnavais de Hoje.

Sheila deixou o queixo cair.

- Ô, Marcelo – cochichou ela – Com essa eu não tenho coragem de discutir, não.

A dona ouviu e fechou a cara.

- E faz muito bem, viu? Tem gente que diz que sou eu que mando nesse povo e que faço ele ficar cego para as falcatruas do governo. Tem gente que me culpa por eu ocupar mais de um dia por causa da minha saúde. Eu estou cansada de ouvir desrespeitos por causa do vacilo dos outros! Eu sou a dona de Fevereiro, mas eu não mando no resto do ano, não.

A dona suspirou e tomou fôlego pra continuar vociferando.

- O samba é coisa séria. Eu existo pro brasileiro se ligar que ele tem couro duro mas carne a é fraca. Vamos dar uma olhada no que acontece longe do umbigo de vocês, seus coisa-ruim!

A apoteose brilhou de novo e um grupo de amigos aparece em uma piscina. Como todo grupo de amigos fiéis, estão tirando sarro de quem não está presente.

- É por isso que eu não tenho patrão... Vou empurrando com a barriga, mas não aturo cara dura de ninguém.

- Pois a minha chefe até fez cara feia quando eu disse que não ia. É tudo uma questão de se impor, entende? Ou me libera, ou eu pulo fora. Isso é meio de vida, não é meio de morte, não.

O telefone toca. Alguém vai atender e fala rapidinho no telefone. O sujeito volta com um sorriso gaiato e uma gargalhada.

- É a Patrícia. Só vem no domingo! Ela vai trabalhar até no sábado, galera!

Gargalhadas e um corinho de “muito otária” ecoou pela piscina. A imagem se misturou com outra. Desta vez uma sala com uns três alunos rabiscando nos papéis. A professora, muito contrariada, sentava num canto escutando o papo dos alunos.

- Viajar no Carnaval é loucura. Eu vou pra Bariloche só no mês que vem.

- As férias do meu pai foram em dezembro. O meu irmãozinho não conhecia a Disney.

- Eu vou estar ocupado demais nesse Carnaval. A empregada foi demitida e eu e meus irmãos vamos ter que aprender a mexer no microondas. Ô, professora! Não tô conseguindo fazer um círculo!

Patrícia suspira e coloca um copo em cima do papel.

- Tenta agora...

Sheila e Marcelo estão até sensibilizados, mas olham pra dona Gorda com honestidade.

- A gente entende o que a senhora tá falando. – disse o diretor Marcelo com toda diplomacia do mundo – Um dia ela vai poder ir pra Bariloche. Hoje, ela trabalha com a gente.

Sheila já está mais à vontade.

- A gente também nunca foi pra Disney!

A dona puxa o ar pra dentro e o confete que já tinha assentado levanta todo de novo.

- A guria não quer ir pra Disney, seus cabeções! Ela quer ir pra Araruama com essa raça ruim que ela arrumou!

Sheila estava valente.

- Mas não dá! Tem trabalho!

A dona bufou e as serpentinas voaram também.

- Dar aula pra esses almofadinhas?! Se ela fosse médica, policial ou bombeira eu nem ligava de ela trabalhar no meu feriado, mas a garota tem pouco dinheiro justamente porque não trabalha em coisa de necessidade. Aí, na hora da folga, vira questão de vida ou morte?!

- A gente não liberou pro outro professor. Se liberar pra ela, vai parecer injustiça. – Ponderou Marcelo.

- Eu tô falando justamente disso, suas bestas! Se o outro gosta de trabalhar até no domingo, dá a chave do curso pra ele! A satisfação dele é essa. Eu só fiquei gorda assim por que meu povo não aceitou a chibata do patrão. Eu ainda estou engordando e ficando cheia de saúde. Meu povo pede esses dias pra ficar satisfeito – A Gorda falava e levantava a poeira – mas se tiver que trabalhar insatisfeito... A COISA VAI FEDER!!! VOCÊS NÃO VÃO QUERER ME VER RODAR A BAIANA!!!

Um chapéu cheio de bananas apareceu na cabeça dela e as cadeiras foram girando. O quarto foi engolido por um tornado. Marcelo e Sheila ficaram com medo de parar em Oz! Só que acordaram na cama onde estavam antes e o quarto estava no mesmo lugar.

Os dois estavam sentados, com cara de susto e os óculos tortos no nariz.

- Sheila, que dona brava!

Sheila estava parecendo um papel de tão branca.

- Eu não sabia que o Carnaval tinha um temperamento desses...

Então eles perceberam uma névoa se formando no quarto. Marcelo pulou.

- Ô Sheila! Essa empregada tá dormindo no serviço. Olha quanta poeira!

- Ué! Mas pra tirar poeira ela sempre foi dez...

Uma voz sinistra brotou do pé da cama.

- ZERO!! NOTA ZERO!!!

O sujeito, se não era um defunto, devia estar se sentindo muito mal. Os cabelos grisalhos foram despontando e os olhos cinzentos foram subindo num rosto alucinado. Reconhecia-se bem de longe a figura de Carlos Imperial. Ele enunciava cada palavra cuidadosamente com sua voz rouca. Parecia estar fulo da vida, mas sustentava um sorriso rasgado.

- Eu sou a Quarta-feira de Cinzas, o Fantasma dos Carnavais Futuros. Estou aqui para dizer que vocês vão passar pro segundo grupo.

- Mas...

- CALEM a boca porque eu estou com uma ressaca desgraçada...! Por que vocês se sujeitam aos clientes malucos? Porque valorizam demais o dinheiro! O verdadeiro valor está no indivíduo!!! Vocês não são os únicos! A carga tributária e a jornada de trabalho do brasileiro são DESUMANAS! Isso atravessa qualquer samba! Vocês tentam e tentam melhorar as engrenagens esquecendo-se que os que as operam são muito mais do que máquinas! São seres humanos! O que impede esse povo de fazer uma revolução desastrosa é o jogo de cintura dos passistas. Se esse povo não tiver entusiasmo, esse país não anda – porque a passarela desse povo sempre correu contra a maré.

Marcelo e Sheila estavam apavorados demais para confessar que não entenderam nada.

O Fantasma Cinzento continuou:

- Eu vou mostrar onde essa Harmonia entre vocês, os funcionários e os clientes vai acabar.

A Apoteose brilhou de novo e lá estava Vitinho, com barba na cara, falando com um professor sem nem olhar para a cara dele.

- Meu amigo, não quero saber de problema – eu quero é solução.

O telefone toca e Vitinho atende animado.

- Sim! Ah, é você, mãe? Eu achei que era algum novo aluno. Eu sei que é seu aniversário, mas você faz aniversário todo ano! Eu não posso parar a minha vida pra ficar farreando com a família!

De lá de dentro sai Ricardo, o professor certinho, de barba e cabelos grisalhos. Ricardo tinha o posto de Reitor da UFRJ. Desta forma ele havia conseguido uma sociedade com a Escola de Belas Artes e o curso de desenho de Vitinho. Os dois estavam ganhando uma grana preta..

- Ô, Vítor, manda mais seguranças do curso lá pra UFRJ porque dois alunos tentaram fugir pra passar o Ano Novo com a família. Já falei que a casa deles agora é o alojamento.

- Sim, senhor! – respondia Vitinho todo empolgado. Depois virava para o professor à sua frente e, com dedo em riste, ameaçava. – Nada de contar para os alunos de Habilidade Específica que a Escola de Belas Artes virou presídio, hein?

Ricardo volta lá de dentro meio contrariado.

- E, Vítor! Manda mais escultores Neoclassicistas para os barracões da Unidos do Largo do Machado e Caprichosos de Botafogo! As esculturas têm que estar impecáveis. Já nos garantiram que ninguém vai ficar sambando perto delas – os passistas vão valsar delicadamente ao som de Tchaikovsky.

A Apoteose começou a desmanchar. Até Sheila e Marcelo estavam apavorados.

- O nosso Vitinho! Nem ao seu aniversário ele quis vir.

- Justo ele que gosta tanto de bolo...

O Fantasma sacudia a poeira com os braços.

- Vocês me dão nojo. A minha voz já está sumindo, mas deixo com vocês o meu aviso. Como dizia o Lalau das Certinhas: “Feijoada completa vem com ambulância!”

Tudo ficou nublado. A Apoteose foi sumindo e mais uma vez os dois estavam a sós no quarto. Os dois suavam frio. Deram uma breve olhada um para o outro e correram para o banheiro. A natureza já seguia seu caminho. Era cada um por si!

No dia seguinte a professora estava menos contrariada, mas pediu para falar com os chefes.

- Olha, gente... Eu andei pensando sobre a sexta-feira de noite. Eu entendo o ponto de vista de vocês, mas...

Sheila, um pouquinho abatida, interrompeu.

- Você vai compensar essa aula?

A professora não entendeu nada.

- Vou... Claro que vou.

Marcelo fez cara de pai de todos.

- Então está tudo bem. Você avisou antes, dá tempo de avisar os alunos... Um dia sem aulas não mata, não.

A cara da professora se iluminou.

- Jura? Que legal! Gente, esse é o melhor lugar do mundo pra se trabalhar!

Ricardo apareceu no corredor com cara de preocupado.

- Mas sábado vai ter aula, né?

Sheila ajeitou os cachinhos e olhou para o filho que continuava grudado no computador.

- Vai, mas você usa sua chave tá, Ricardo? Nós vamos para Saquarema.

Ricardo suspirou sossegado.

Vitinho olhou a mãe e o pai intrigado.

- Ué! A gente vai perder a apuração das Escolas de Samba pela televisão? E o desfile?

Marcelo puxou o mouse do garoto.

- A gente vê o compacto. Se a gente trancar a vida de casa pro trabalho e do trabalho pra casa, vamos virar um samba de uma nota só!

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